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segunda-feira, 30 de maio de 2011

AposTa


(Gleison Gomes)
Era seu costume semanalmente jogar na loteria. Por tempos construíra em seu pensamento um forte pressentimento de ser contemplado com um prêmio que mudaria definitivamente a sua vida. Simplesmente acreditava ser possível.
Na primeira semana daquele mês de março acumulou um considerável prêmio na Mega Sena. Era a sua oportunidade. Juntou os bilhetes que costumava jogar toda semana e pôs-se mais uma vez a repetir os números que rotineiramente jogava durante décadas. Nunca havia acertado mais que três números num mesmo bilhete durante todos estes anos.
Um dia pela madrugada, sonhou algo estranho do habitual. Imaginava-se dentro de um poço de bosta se afundando. Tentava de todas as formas procurar sair, mas não conseguia. Foi uma coisa tão forte que acordou assustado. Suado, sentindo frio, ficou a beira da cama procurando entender o sonho. Nada conseguiu.
Na manhã seguinte, meio preocupado, saiu a caminhar para o trabalho. Em frente ao bar da esquina, encontrou o senhor Candido, um exímio conhecedor de sonhos e simpatias. Era um velho amigo que não via há tempos. Angustiado, pôs-se a desabafar com o amigo. O senhor Candido logo não hesitou em lhe dizer:
– Isso é dinheiro! E olha que não é pouco não. Pra mim, bosta não tem outra relação que não seja com dinheiro meu amigo.
Repentinamente ficou perplexo. Do semblante sério e preocupado, surpreso, ficou alegre. Nestes poucos segundos fez uma breve relação do sonho com a aposta na loteria. Viajou longe em seus pensamentos. Saiu do bar agradecendo ao amigo e pôs-se a sonhar com aquilo que nunca pode ter em sua vida.
Por si só tudo era amargo. Saía cedo de casa para trabalhar numa construção como auxiliar de pedreiro, aonde chegava muitas vezes reclamando de dor nas costas, tamanho era o trabalho forçado que fazia. Parecia tudo aquilo, em muitas ocasiões, um poço de bosta na qual ficara atolado sem ter como sair. Era assim que via em sua aposta a esperança de mudar de vida.
Chegava o dia do sorteio. Ansioso, nem dormiu direito durante a noite. Saiu depressa pela manhã até à loteria para conferir o bilhete. Seus costumeiros números eram sempre o seis, o catorze, o vinte oito, o trinta e três, o trinta e cinco e o quarenta e sete. Feliz, viu coincidir o número seis. Depois, veio catorze e logo o vinte oito. Inexplicavelmente entusiasmado, mal esperava o que ainda viria.
Os últimos três números para seu azar, nada coincidiram com os sorteados. Frustrado, mais uma vez o que conseguiu foi somente acertar a metade do jogo. Seus sonhos de uma vez se desmoronaram. Nada levou da sua aposta. Mais uma vez, por mais de uma década, continuaria ele ainda no meio da bosta.

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